O país que não lê é para quem?


Viver não tem sido fácil. Volta e meia, alguma proposta cretina tem seu debate reacendido graças a algum parlamentar ou órgão que deseja implementar tal ação. Nesta semana, a Receita Federal indicou que pode acabar com a isenção de impostos sobre livros. A justificativa seria de que estes itens são consumidos, em sua maior parte, pela parte mais rica da população. Com isso, a venda de livros passaria a ser tributada em 12%. Além disso, o governo cita que famílias com renda de até dois salários mínimos não consomem publicações que não sejam didáticas, enquanto a maioria das vendas é registrada na parcela que recebe mais do que 10 salários mínimos.

Obviamente, a situação gerou muitas críticas contra a Receita Federal, que distorceu totalmente os dados, encabeçada pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, o mesmo cujas entrevistas costumam ter como cenário uma estante de livros completamente vazia. E é claro que a proposta não faz sentido na prática. Se o livro já é caro e de difícil acesso às populações de classes mais baixas, não será cobrando imposto que se aumentará as chances de pessoas pobres lerem.

A leitura aprimora o vocabulário e dinamiza o raciocínio e a interpretação. O contato com os livros ajuda ainda a formular e organizar uma linha de pensamento. Portanto, a quem interessa um país de ignorantes?

A justificativa é tão simplista que fica na cara que o objetivo é só fazer a manutenção das classes dominantes e dominadas. Ora, se não fosse isso, estaríamos então taxando outros artigos de luxo (que, diga-se de passagem, não são taxados), como helicópteros, iates e jatinhos, que não pagam IPVA, ou, quem sabe, como fez nossa vizinha Argentina, taxar as grandes fortunas. Não existe um debate justo sobre taxação de livros sem antes taxar esses elementos. 

Por fim, é importante lembrarmos de Carolina Maria de Jesus. A ex-catadora de papel e materiais recicláveis, que conheceu de perto a fome e a miséria e trouxe nas páginas de Quarto de despejo sua paixão pelos livros. Conforme registrado no livro, no dia 23 de julho de 1955, Carolina escreveu: “Todos têm um ideal. O meu é gostar de ler”.

O hábito da leitura também proporcionava à Carolina Maria de Jesus uma capacidade única de interpretar a realidade social e política do país. E é nisso que percebemos a importância da democratização dos livros em um país como o nosso.